TIROTEIO POLÊMICO
É injusta a versão ainda corrente entre
historiadores e memorialistas de que o então Presidente do Rio Grande do Norte,
Juvenal Lamartine (até 1930 o Chefe do Executivo Estadual era chamado
Presidente) mandou abrir fogo contra os caravaneiros da Aliança Liberal que
percorriam o país em campanha eleitoral.
Em depoimento a Glauco Carneiro, Batista
Luzardo refere-se emocionalmente ao episódio. Indo protestar ao Governador contra a violência, declarou:
"O Lamartine fora o meu companheiro na Câmara. Abriu os braços, efusivo: -
Seu Luzardo! Como tem passado? Meu velho amigo!... (cínico como o diabo). Eu
entrei de rijo, começando pela tropa presente nas estações, desde Nova Cruz...
Era um cangaceiro cínico, acostumado a matar, daqueles que bebiam o sangue da
vítima." O escritor e jornalista Paulo Duarte, no segundo volume de suas
memórias, incide no mesmo erro de julgamento:
"...aí chegou, também, no dia daquela nossa primeira visita (ao
Instituto do Café, em Paris) Juvenal Lamartine, antigo Governador do Rio Grande do Norte.Conhecera-o quando estive em
Natal com a Caravana Democrática, em 1930. Fomos lá recebidos à bala, tendo
três pessoas morrido, assassinadas pela sua polícia, quando realizá-vamos o
primeiro comício, ficando cerca de dez feridos. Depois do estrupício mandou
visitar-nos e, no mesmo dia, nos recbeu em palácio, lamentando pesaroso o
acontecimento... Com a Revolução de 30, teve que fugir e, agora, venho
encontrá-lo no Instituto do Café. Ao ser-me reapresentado reconheceu-me
desapontado, mas depois conversamos longamente. Deu-me a idéia que eu já tinha
dele: daqueles donos da política, capazes de todas as violências e de todas as
generosidades."
Não fica atrás, o Desembargador João
Maria Furtado, que escreveu na página 109 de seu livro "Vertentes":
"...no mesmo local qm que, a 7 de fevereiro de 1930, a Caravana
Democrática fora tiroteada pela polícia e capangas do Governador Juvenal Lamartine."
Desembarcando de um trem especial na
estação da Great Western, na Ribeira, a caravana foi recebida por uma multidão
que se espraiava pela praça Augusto Severo, daí, seguindo a pé em direção da
avenida Tavares de Lyra. Logo na esquina da Dr. Barata o telegrafista José
Anselmo ensaiou um discurso, mas foi obrigado a desistir, forçado a descer de
um tamborete improvisado em tribuna, pelos apupos de um pequeno grupo liderado
por Otávio Lamartine, Lauro Botelho, Elias Galvão e outros. Na calçada do Hotel
Internacional, onde a caravana se instalou, o professor Fontes Galvão, de sua
cadeira de rodas, tentou, inutilmente, dizer algumas palavras. Em seguida,
quando, de uma das janelas do hotel coberta com a Bandeira Nacional, Batista
Luzardo iniciava o comício com inflamado discurso, o grupo governista voltou à
carga, tentando tumultuar exigindo, inclusive, que fosse retitrada a Bandeira
Nacional, que não podia estar ali servindo de forro, etc. O tenente do
Exército, Everaldo Vasconcelos, irritado, aceitou o desafio, e foi até eles
esponder às provocações. Em meio a áspera discurssão, foi baleado, e começa o
tiroteio.
"Eu estava com Horácio Barreto e
Vicente Fernandes - declara textualmente o Dr. Aldo Fernandes - e demos uma
carreira danada, e fomos bater no cais da Tavares de Lyra. Daí não podia-mos
mais prosseguir, e ficamos encolhidos
num canto. E foi tiro como diabo. Quando terminou o tiroteio, não havia
mais ninguém. Só tinha chapéus de palha. Era chapeu espalhado por toda a
avenida. Vi algumas pessoas deitadas, mortos e feridos. Quando a coisa serenou,
fomos à casa de Cícero Aranha, que morava ali perto. Estava indignado. - Comoé
que Lamartine manda fazer uma coisa dessa? Eu estava lá com minhas irmãs...
Naquela mesma ocasião resolvemos ir a casa de Lamartine pedir explicações,
protestar contra tudo aquilo. Chegando lá, veio ao nosso encontro, angustiada,
com as mãos na cabeça, D. Silvina. - Dr. Aldo, vocês não viram as minhas filhas
por lá? Elas foram ao comício e ainda não chegaram..."
A aflição da esposa do Presidente, preocupada com as filhas que
até aquele instante não haviam retornado do comício da Caravana Democrática,
desmente actegoricamente, àqueles que atribuem a Juvenal Lamartine de Faria a
responsabilidade pelo episódio sangrento de 7 de fevereiro de 1930, do qual
entre inúmeros feridos, morreram o menor Indaleto de Freitas, o engenheiro
agrônomo Fernando Barbosa e o comerciante José Faustino do Amorim.
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Do livro: 'HISTÓRIAS QUE NÃO ESTÃO NA
HISTÓRIA' de autoria do Professor José de Anchieta Ferreira. Editado e
Publicado pela RN Gráfica e Editora Ltda (2ª Edição Ampliada) - Natal/RN, 1989.
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